[RESENHA] O Retrato de Dorian Gray| Oscar Wilde
"Porque só há uma coisa no mundo pior do que ser falado: é não ser falado."
O livro, mesmo fictício, foi a chave central do processo contra o escritor, que culminou em sua prisão, em 6 de abril de 1895, por “cometer atos imorais com diversos rapazes”. Por conta de sua homossexualidade, que era proibida na Inglaterra, o escritor, que já era bem conhecido na comunidade intelectual britanica, foi condenado à pena máxima de prisão com trabalhos forçados.
Os sentimentos e os desejos são fundamentais para justificar o avanço da narrativa, e podemos perceber isso já no primeiro capítulo, onde é feita a introdução dos três personagens principais da obra, Dorian Gray, Lorde Henry e Basil Hallward, que, de forma velada, competem pela atenção um do outro. Essa “rixa” sentimental guia os outros conflitos. E isso foi o suficiente para colapsar os sensíveis leitores homofóbicos vitorianos.
Por conta desse burburinho negativo, o autor editou sua obra, removendo parte do subtexto homosexual (spoiler: não adiantou muita coisa e o livro continua bem 🏳️🌈), e dando origem a versão mais conhecida, na qual, foram adicionados 7 capítulos para “contornar” os buracos que a remoção de algumas partes deixou.
Essa edição que está comigo agora é a sem censura, que explica melhor esse conflito todo, e é cheia de notas de rodapé e alguns textos de apoio muito bons. Agora, vamos ao enredo desse livro tão polêmico.
"Não seria feliz se não o visse todos os dias. Naturalmente, às vezes só por alguns minutos. Mas poucos minutos com alguém que você idolatra significam muito."
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O romance se inicia com Lorde Henry Wotton, visitando seu colega, Basil Hallward, que pintava o retrato de um belo jovem. O jovem em questão era Dorian Gray, um rapaz muito bonito, que fascinava a todos com seus olhos azuis, boca avermelhada, maçãs do rosto rosadas, cabelos loiros e um brilho sutil de inocência no olhar.
Com as devidas apresentações, Henry começa a demonstrar grande interesse pelo jovem, por sua encantadora beleza, o que deixa o pintor preocupado (e, vamos ser honestos, levemente enciumado, pois o mesmo já sentia uma paixão por Dorian).
Henry não é exatamente o tipo de sujeito de boa fama, e possui algumas ideias um tanto… problemáticas, e isso, infelizmente, acaba contagiando o garoto, que vai, aos poucos, abraçando o cinismo e a babaquice indiferença de Henry ao mundo. Henry, entre elogios à aparência de Dorian, o mostra as vantagens de ser jovem e belo, e ao mesmo tempo, mostra como essa fase vai logo acabar. A cada dia que se passa, a beleza de Dorian vai se esvaindo, e o tempo vai tirar o melhor dele. Desesperado com essa ideia implantada em sua cabeça, ao ver o quadro pronto, uma representação perfeita e imaculada dele mesmo, Dorian afirma que daria tudo para se manter eternamente belo enquanto só o quadro sofreria as consequências da vida e da idade. Aqui temos presente o infame pacto fáustico (leiam Fausto, do Goethe, é bem bom, ou assistam Madoka Magica, também é bem bom) que “concede” esse desejo e traz diversas consequências para o protagonista, que permanece belo e jovem independente do que acontece à sua volta.
"Diz-se às vezes que a beleza é apenas superficial. Pode ser. Mas pelo menos não é tão superficial quanto o pensamento. Para mim, a beleza é a maravilha das maravilhas. Só as pessoas superficiais não julgam pelas aparências. O verdadeiro mistério do mundo reside no que é visível, não no que é invisível."
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Agora, vamos a minha humilde opinião.
O Retrato de Dorian Gray é um livro assustadoramente bem escrito. Eu já tinha tido contato com outras obras do escritor, como O Fantasma de Canterville e O Rojão Notável, e já nesses contos era possível ver o tamanho do artista que o Oscar Wilde foi. A forma que ele escreve é TÃO BOA DE LER. Eu acho raro achar escritores que mantêm o mesmo “estilo” quando escrevem contos e romances, e Oscar Wilde é uma desses casos. A qualidade se mantém, na verdade, a qualidade ultrapassa o conceito positivo que eu já tinha antes.
Tudo que eu li de Wilde foi bonito e bem humorado. Críticas ácidas à sociedade da época, a costumes e aos próprios artistas estão presentes em todas as obras que eu li, e O Retrato de Dorian Gray é o que tem de melhor nisso. Nossa que livro bom.
O enredo também é fantástico e bem construído (não sei como ficou a edição censurada… no futuro farei uma comparação de ambas). A relação dos três personagens combina muitíssimo bem, e é assustador e interessante ver a lábia de Henry influenciar Dorian a ponto de moldá-lo, transformando o rapaz doce em alguém egoísta e egocêntrico. Afinal, Henry o convenceu que o que mais importa é a beleza e agora, ele a teria eternamente, o que mais importa além disso?
Dorian vira um personagem tão ruim quanto aquele que o influenciou. Ele é egoísta, arrogante e narcisista, que idealizou a si mesmo a ponto de esquecer que a vida não pode ser confundida com a arte, e quando percebe isso, já não tem volta.
Dorian Gray tenta fugir da própria humanidade e ser algo estático, como a pintura, não quis crescer, não quis aprender com as próprias ações, ele quis se manter intocado por tudo. E não é possível manter isso.
O romance entre os personagens e como isso afeta a psique de Dorian Gray é divertidíssimo de acompanhar. Eu gostei muito e cheguei ao final do livro chocadíssima.
Esse é um livro que eu adoraria esquecer para ler do zero e me surpreender novamente.
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Obrigada por ler até aqui!
Beijinhos,
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